Biodefensivos a partir de micróbios do solo é o futuro da agricultura
quarta-feira, janeiro 01, 2020
Félix
Gonçalves Siqueira, investigador e coordenador de projetos da Embrapa (Empresa
Brasileira de Pesquisa Agropecuária) falou à Vida Rural sobre o futuro da
produção agrícola. E este vai passar necessariamente por um sistema mais
sustentável, que aponta para o uso de elementos já existentes na terra. Ou
seja, a proteção de plantas será feita a partir dos micróbios do solo.
Porque é que o futuro da agricultura depende de
entender a interação microbiana?
O futuro, que na verdade nem podemos
mais chamar de futuro, pois já é presente, são as técnicas agrícolas que
favoreçam os grupos de microrganismos que tem uma relação simbiôntica com a
agricultura. Precisamos entender que o solo é vivo. Essa é a primeira coisa que
a devemos entender. E quais são os benefícios que o microbioma vai trazer para
o solo, ou seja, os microrganismos daquele bioma que moram junto às plantas.
A rotação de culturas, amplamente
adotada no Brasil, é exatamente isso – quando você coloca um determinado grupo
de plantas intercaladas, você favorece grupos de microrganismos diferentes,
então os processos biológicos passarão a ser cada vez mais intensivos.
Isso significa o fim dos agroquímicos?
É claro que os químicos vão
continuar, mas no sentido mais amplo. A nossa relação, dos microrganismos, do
ser humano com as plantas, é a relação dos químicos, eles é que nos nutrem,
eles é que nos protegem. Agora, o mundo microbiano está a ser descoberto nestes
muitos processos já em andamento. E virão muito mais.
A diferença, acredito, é que nos
próximos dez, 20 ou 30 anos nós vamos estar a falar muito mais de qual é o tipo
de material, de matéria-prima que eu vou colocar no solo para favorecer
determinados grupos de microrganismos.As grandes empresas passarão a
questionar-se: eu preciso de nutrir os microrganismos que moram no solo, que é
onde eu vou colocar as plantas. Então, com as técnicas ômicas, como parte da
genômica, consegue-se saber quais os grupos de bactérias existentes, de fungos
e famílias, e começamos a comparar isso. Então esse Big Data, essa quantidade
de dados que você gera, destas interações entre microrganismos e planta, serão
cada vez mais utilizados pelas empresas.
Isso cria um novo perfil de pessoas a trabalhar com
agricultura, certo?
Isso é uma coisa muito interessante,
porque as disciplinas, ou seja, as áreas de conhecimento, estão literalmente a
fundir-se. Pessoas que trabalham com programação, softwares, que nunca foram ao
solo para plantar um pé de qualquer coisinha de planta – elas serão
fundamentais para analisar esses dados, ou seja, quem são os microrganismos que
nós queremos favorecer no nosso solo, para nossa cultura, para interação com
aquele microrganismo, para que ela responda ao seu sistema imunológico
precisando de menos defensivos químicos.
Qual é o próximo desafio, e como o vamos vencer?
Conhecermos mais esse universo, que é
realmente um universo, uma galáxia de coisas: quem comunica com quem, quem é
aliado do quê. Decifrar esses códigos de comunicação química entre os
microrganismos, nessa ‘cidade populosa’ que é a rizosfera da planta, é o grande
desafio, seja aqui, seja na China, seja nos Estados Unidos, poque a casa da
planta e a casa dos microrganismos é o solo, então solo é vivo. Precisamos de
entender essa dinâmica cada vez mais.
As
ferramentas são boas e vão ficando cada vez maiores: bioinformática, ou seja,
extraem DNA, extraem RNA, extraem proteínas eu consigo processar isto. Big
Data, computadores, sistemas de software, vão ficar cada vez mais sofisticados
para que possamos criar esses algoritmos. Vamos saber que carboidratos suprir,
que proteína, que mineral favorece um determinado grupo de microrganismos. Com
isso, automaticamente eu favoreço a produção de novos compostos químicos e a
resposta da planta é essa. Se eu tenho o favorecimento desse grupo de microrganismos
e esse outro grupo de compostos químicos eu desfavoreço a planta, essa vai ser
a dinâmica do momento e das próximas décadas, entender as esferas populacionais
da rizosfera das plantas.
Fonte: Vida Rural
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