Programa brasileiro para biocombustíveis entra em vigor nesta terça e pode ajudar no combate ao desmatamento
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terça-feira, dezembro 24, 2019
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Programa brasileiro para biocombustíveis entra em vigor nesta terça e pode ajudar no combate ao desmatamento
terça-feira, dezembro 24, 2019
O RenovaBio, política de biocombustíveis do Brasil, entra em vigor nesta
terça-feira (24) e vai trazer mecanismos que visam incentivar empresas do setor
a cumprir rigorosas regras contra o desmatamento para expansão agrícola.
Essas metas devem mobilizar as indústrias de etanol e biodiesel em prol
da redução de danos ambientais em momento em que o país registra avanço do desmatamento, segundo especialistas.
A iniciativa, que visa garantir receita adicional ao produtor de
biocombustível pela redução de emissões de gases de efeito estufa proporcionada
pelo uso de etanol e biodiesel, requer que áreas usadas para cana, soja e milho
não tenham sofrido desmate após novembro de 2018, ainda que a lei ambiental
permita.
Essa receita adicional deverá ser obtida pela
emissão, pelas usinas, dos chamados créditos de descarbonização (CBio), que
serão comprados pelas distribuidoras de combustíveis para compensar as emissões
pela venda de combustíveis fósseis.
No horizonte de uma década, por meio dos CBios, o
RenovaBio tem objetivos de retirar cerca de 670 milhões de toneladas de dióxido
de carbono da atmosfera, contribuindo para o cumprimento das metas do Acordo de
Paris, além de impulsionar a indústria de biocombustível.
"Se tiver um hectare desmatado após novembro
de 2018, a propriedade rural está fora do RenovaBio", destacou o gerente
de Economia e Análise Setorial da União da Indústria de Cana-de-açúcar (Unica),
Luciano Rodrigues, em referência a áreas produtoras das principais
matérias-primas dos biocombustíveis.
Em entrevista à Reuters, ele disse que, para evitar
questionamentos, as regras do RenovaBio são mais rigorosas do que as
estabelecidas pelo Código Florestal, que autoriza o desmatamento de parcelas da
propriedade rural em percentuais que dependem da região, com normas mais
severas no Bioma Amazônico, onde é permitido pela lei desflorestar até 20% da
área.
O rigor do RenovaBio em relação ao desmatamento, a
principal fonte de emissão de carbono no Brasil, será estabelecido em um
momento em que integrantes do próprio governo e agricultores questionam a Moratória da Soja, um programa da indústria que
proíbe a compra de grãos de áreas do Bioma Amazônico desflorestadas após 2008.
Fazendeiros querem ter o direito de usar toda a área agrícola que a lei
permite.
Desafio de rastrear
No caso do setor de etanol de cana, que pela
própria lógica do negócio trabalha com fornecedores mais próximos das usinas, o
controle da origem da matéria-prima livre de desmatamento seria mais fácil,
concordou o economista da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos
Vegetais (Abiove), Daniel Amaral.
Questionado, ele admitiu que a rastreabilidade da
soja e do milho é questão que exige atenção, pois os grãos são comprados de
vários fornecedores e armazenados em um mesmo silo.
"Isso acaba sendo um desafio (...) a soja,
desde que armazenada em boas condições, ela pode ser transportada de Mato
Grosso para a China, para qualquer lugar. Isso traz desafio maior de estreitar
o relacionamento com o produtor", comentou
ele, lembrando que o RenovaBio exige que o agricultor tenha Cadastro Ambiental
Rural (CAR), uma ferramenta de rastreabilidade.
Ele disse ainda que o RenovaBio, por meio dos
CBios, deverá dar um incentivo financeiro aos integrantes da cadeia produtora,
permitindo uma espécie de pagamento por serviços ambientais. Segundo Amaral,
caberá a cada setor negociar para definir valores que poderão ser repassados
aos fornecedores.
De olho nisso, dezenas de empresas já estão
participando do processo em busca da aprovação para emissão de CBios, incluindo
unidades de multinacionais como a Cofco, Tereos e BP, além de brasileiras como
Biosev e São Martinho, de acordo com a Agência Nacional do Petróleo, Gás
Natural e Biocombustíveis (ANP).
Até o início de dezembro, 47 companhias estavam em
fase de consulta pública para certificação visando emissão dos certificados.
Outras 40 estavam sob aviso de início de consulta
pública, enquanto 29 passavam por consulta e cinco haviam sido aprovadas,
apontou a ANP, incluindo unidades de biodiesel BSBios e JBS, além plantas de
etanol da São Martinho e da usina Vale do Paraná.
Com base neste interesse inicial, a reguladora
afirmou à Reuters em nota que acredita que as empresas aprovadas nos próximos
meses serão suficientes para que o país atinja a meta de 2020, de
descarbonização de 28,7 milhões de toneladas.
"Os produtores de maior volume estão em
processo de certificação, o que nos dá segurança para alcançar as metas."
Eficiência, a chave do negócio
Enquanto associações do setor admitem que ajustes
finos precisam ser feitos para aprimorar o RenovaBio, todos têm certeza de que
as empresas precisarão buscar eficiência para conseguir tirar o melhor proveito
do programa.
"A usina mais eficiente vai emitir mais CBios (...)
O programa vai resultar em mais produtividade (...)", disse o diretor técnico da Unica, Antônio de Pádua
Rodrigues.
O grau de eficiência será medido no processo de
autorização para emissão dos CBios e ditará a proporção de certificados a serem
obtido pelos produtores para cada volume de etanol comercializado.
Assim uma usina mais eficaz poderá emitir
certificado com metade do volume de etanol que uma usina menos eficaz
precisaria comercializar para obter o mesmo CBio, disse o diretor técnico da
Unica.
"A diferença do ganho entre uma mais
eficiente e uma menos eficiente pode ser de 100%", apontou ele, o que explicaria a corrida
por uma nota melhor e, por consequência, pela possibilidade de maior receita
com o RenovaBio.
O presidente da União Nacional do Etanol de Milho
(Unem), Guilherme Nolasco, defendeu que a RenovaCalc (calculadora para definir
a nota de desempenho ambiental das usinas) seja ajustada para capturar alguns
ganhos de eficiência, como por exemplo a redução na aplicação de adubos devido
ao resíduo de fertilizante deixado no solo para o milho, após o cultivo da
soja.
"Há uma dificuldade de segregação de
insumos de primeira e segunda safra, mas o governo e a ANP estão muito abertos
a construir os ajustes necessários (...)", disse Nolasco, acrescentando que, no
que diz respeito à questão ambiental, ainda que o milho usado pelas usinas seja
plantado"Em áreas consolidadas"
(sem desmatamento), o setor está discutindo a criação de um "dispositivo
de rastreabilidade de origem".
Marcos Fava Neves, professor titular da
USP e da FGV, especialista em planejamento estratégico do agronegócio, avalia
que o setor conta com amplas áreas de pastagem no Brasil para ampliar a
produção de matérias-primas sem apresentar problemas ao RenovaBio, e que os
CBios, ao ampliarem a renda das empresas, estimularão a produção sustentável.
Assim como as associações, Neves
evitou fazer estimativa de preço para o mercado de CBio. Mas ele avaliou que a
margem das usinas pode aumentar em cerca de 30% com o programa e os
certificados.
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