Estudantes de escola na Paraíba criam sistema que permite filtrar e desinfectar água da chuva
segunda-feira, dezembro 30, 2019
Projeto ‘Telha
Oásis’ foi desenvolvido com materiais de baixo custo. Além da água da chuva, o
sistema também possibilita a filtragem e desinfecção da água de rios, cacimbas
e açudes.
Estudantes
de uma escola em Campina Grande desenvolveram um projeto que possibilita
moradores da zona rural filtrar e desinfectar a água captada da chuva. A “Telha
Oásis”, além de permitir o aproveitamento de água proveniente da chuva, também
permite a filtragem e desinfecção de águas oriundas de rios, cacimbas e açudes.
O projeto, desenvolvido com materiais de baixo custo, foi criado pensando nas
dificuldades enfrentadas por essas pessoas em períodos secos na região.
“A captação de água por telha é uma coisa
fatídica já, não tem novidade nenhuma. Porém, o nosso projeto consiste em uma
adaptação de duas telhas, a primeira perfurada em cima, a de baixo inteira, e
entre elas existe um meio filtrante que é constituído de areia e carvão
ativado, então essa água corre por esse leito filtrante, e a gente adaptou um
cano de PVC e esse cano vai receber essa água não como uma calha, mas já
fechado, e no fim essa água já sai filtrada”, explica o professor de biologia
Ronaldo Justino, um dos orientadores do projeto.
O projeto “Telha Oásis” foi desenvolvido por estudantes do
ensino médio da Escola Virgem de Lourdes, durante uma competição que ocorre
anualmente na instituição. Além dos estudantes e do professor Ronaldo, a equipe
também contou com a orientação do professor de física Felício Aguiar.
Um dos estudantes que participaram da
criação do projeto, Gabriel Chaves, de 16 anos, explica que o sistema foi
desenvolvido para atender um dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS)
estabelecidos pela Organização das Nações Unidas (ONU). “Esse projeto é um
produto da nossa startup Cielus, uma empresa que nós criamos para a competição.
O nosso projeto prioriza o acesso à água potável, por isso desenvolvemos uma
telha que fosse capaz de captar e filtra água da chuva".
O professor Ronaldo diz que o diferencial
do projeto é a utilização de materiais de baixo custo. “A filtragem da água no
sistema acontece sem adicionar uma única gota de cloro, basicamente a partir de
tecnologias que são não apenas do ponto de vista construtivo viáveis, mas
também do ponto de vista econômico. Então umas das nossas maiores preocupações
foi de deixar o projeto num custo que fosse bem abaixo do valor de um aparelho
celular, por exemplo, que é algo que quase todo mundo tem”, destaca.
“Tudo foi pensado justamente para fazer com que a pessoa que
está precisando de água potável possa ter acesso com um investimento bem
pequeno, e a estimativa de durabilidade do produto é de 10 anos”, diz Ronaldo
Justino.
Projeto 'Telha Oásis' foi desenvolvido por estudantes durante competição em escola de Campina Grande — Foto: Ronaldo Justino/Arquivo Pessoal |
O professor explica que é preciso realizar a manutenção da areia
que há na “Telha Oásis”, o que é importante para higienizar o leito filtrante
do sistema. “Não é nada tão complexo, é só lavar a areia e remontar o produto”,
afirma Ronaldo.
O projeto foi pensado para ser criado com
produtos que já existem no mercado, mas precisou de algumas adaptações. “A
areia que há dentro do leito filtrante, por exemplo, é essa areia utilizada em
filtros de piscina, que já existe no mercado. Mas o corte do cano, que vai como
calha da telha, acompanha o design da telha, então tem que ser feito a partir de
uma mini retífica”, salienta Ronaldo.
Filtragem
de água armazenada em recipientes
Além da água captada
da chuva, o sistema permite filtrar e desinfectar a água oriunda de rios,
cacimbas e açudes. “O projeto foi pensado para filtrar essas águas de corpos
aquáticos que são também naturalmente utilizados, mas que, por conta do uso
inadequado, da presença de animais, por exemplo, precisam de tratamento, de
retenção de segmentos de matéria orgânica e desinfecção”, ressalta o professor.
A “Telha Oásis” também foi desenvolvida
para ajudar moradores da zona rural da região a tratarem a água que é
armazenada em recipientes. Através de uma bomba e um interruptor acoplados no
sistema, é possível realizar a filtragem dessa água.
“Mesmo quando não estiver chovendo, e
caso queiram filtrar essa água armazenada em baldes e potes, por exemplo, é só
ligar o interruptor e conectar a bomba, que vai jogar essa água turva que está
no balde para um recipiente que há em cima da telha, que vai receber essa água
já filtrada”, explica o professor Ronaldo.
Projeto também foi desenvolvido para ajudar moradores da zona rural a tratarem a água que é armazenada em recipientes — Foto: Ronaldo Justino/Arquivo Pessoal |
O sistema também possui em sua estrutura uma lâmpada UV. “Essa
água vai escorrer para dentro de um recipiente onde há uma lâmpada UV, que é
germicida. Radiação UV já é uma tecnologia utilizada em várias partes do mundo
para tratamento de água, principalmente porque ela é capaz de inviabilizar
vírus, que não são eliminados com tratamento convencional”, ressalta o
professor.
Validação
do sistema em comunidades da zona rural
Após ser apresentado
durante a competição na escola em Campina Grande, o projeto “Telha Oásis”
passou pelo teste de validação, em outubro deste ano. O teste aconteceu com
moradores da comunidade Roda de Pedra, localizada entre as cidades de Campina
Grande e Pocinhos, no Agreste paraibano.
Professor e estudantes durante validação do projeto na zona rural do Agreste paraibano — Foto: Ronaldo Justino/Arquivo Pessoal |
“O nosso produto foi
validado numa comunidade que é carente de água, que é a comunidade Roda de
Pedra, uma região que apresenta um relevo bastante acidentado, com um
afloramento de rochas. Água ali é complicado, porque quando não chove, só é
proveniente de tanque de pedra ou de carro-pipa”, relata o professor.
O estudante Gabriel Chaves conta que para
a ação de validação do sistema, ele, o professor e os colegas visitaram nove
residências da comunidade, que é atendida pelo Programa Um Milhão de Cisternas,
do Governo Federal. “Nós visitamos nove residências de uma comunidade rural
próxima ao município de Pocinhos, porque nossa intenção era fazer com que essas
pessoas conhecessem o produto, então nós apresentamos o projeto e explicamos
como funcionava”.
"Nessa comunidade nós observamos a dificuldade que os agricultores enfrentam quando à disponibilidade e qualidade da água, o que nos deu um desejo ainda maior para o desenvolvimento do projeto, para ajudar essas pessoas", afirma o estudante Gabriel Chaves.
Professor e estudantes foram até comunidade na zona rural do Agreste da Paraíba para validar o projeto 'Telha Oásis' — Foto: Ronaldo Justino/Arquivo Pessoal |
Projeto
criado durante competição na escola
O projeto “Telha
Oásis” foi desenvolvido durante uma competição realizada na Escola Virgem de
Lourdes. A competição, que teve início em julho deste ano, contou com duas
etapas. A primeira foi a concepção do produto e desenvolvimento da ideia, já a
segunda fase foi para o desenvolvimento do produto e a elaboração de um plano
de negócio.
“Foi nessa primeira fase da competição
que nós criamos a startup Cielus e o produto da empresa, que é a ‘Telha Oásis’.
Nessa primeira etapa nossa equipe ficou em primeiro lugar na competição e, na
segunda fase, nós ficamos em segundo lugar”, frisa o professor Ronaldo.
“O sistema combina basicamente a forma mais
comum de captação de água em regiões como a do nosso semiárido, com processos
de remoção de sedimentos e matéria orgânica da água, além da eliminação de
patógenos através de uma lâmpada UV. Durante a apresentação na escola, nós
tornamos potável uma amostra de água coletada de um açude da cidade de Lagoa
Seca, aqui no Agreste paraibano”, frisa Ronaldo.
“Nosso interesse é que o projeto seja viabilizado não para lucrar, mas para suprir a necessidade dessas pessoas que padecem sem água”, afirma o professor Ronaldo Justino.
Validação do projeto 'Telha Oásis" aconteceu em uma comunidade da zona rural, na Paraiba — Foto: Ronaldo Justino/Arquivo Pessoal |
O projeto “Telha Oásis” foi apresentado também ao poder público.
Segundo o professor Ronaldo, alguns vereadores e deputados da Paraíba já
conheceram o sistema. “Apresentamos o projeto ao poder público, visando
justamente tornar esse sistema uma política pública de saneamento e convivência
com a seca”, pontua.
“Além disso, nós fizemos
um contato primário com o Insa [Instituto Nacional do Semiárido], e aí fomos
convidados a apresentar a ideia a um professor doutor, especialista em
tecnologias de convivência com a seca e captação de chuva. Então fizemos
contato prévio com o professor Kleper Borges, lá do LabDes, o Laboratório de
Dessalinização da Universidade Federal de Campina Grande”, conta o professor.
O protótipo do projeto continua na
escola, mas, conforme Ronaldo, a ideia é doar o sistema para algum dos
moradores da comunidade visitada para validação. “Nós queremos fazer isso como
forma de incentivar e de estimular, porque nós temos uma oportunidade de
mostrar o projeto, mas nada impede de uma estudante do interior, com a
orientação devida, potencializar ou modificar o projeto e utilizar de outras
formas”, afirma Ronaldo.
“Nosso
objetivo é conseguir montar esse sistema com areia lavada de rio, que vai
permitir um insumo com maior viabilidade, inclusive para baratear o preço do
produto. Estamos todos entusiasmados e interessados em viabilizar esse projeto
no mercado”, conclui o professor.
Projeto 'Telha Oásis' foi desenvolvidos por estudantes do ensino médio de uma escola em Campina Grande — Foto: Ronaldo Justino/Arquivo Pessoal |
Fonte:G1
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