O que mudou no Brasil rural segundo o novo Censo Agropecuário?
segunda-feira, novembro 12, 2018
O retrato fiel do meio rural brasileiro, publicado pelo Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) na última semana foi confeccionado por 21 mil recenseadores, em visitas a 7,5 mil endereços, entre outubro de 2017 e fevereiro de 2018.
A radiografia é ótima, melhor do que uma pesquisa, e permite conhecer melhor nossa realidade rural, inclusive comparar com os dados do último Censo, realizado em 2006.
A honestidade intelectual não pode faltar na hora de interpretar e avaliar a realidade do campo, mas alguns já se adiantaram no exercício maldito de usar ou interpretar os dados que convém com o objetivo de justificar ideologias ou propostas. Dentre as principais comprovações deste Censo, é verdadeiro afirmar que:
- A área ocupada pelos 5 milhões de estabelecimentos rurais aumentou em 16,3 milhões de hectares, que correspondeu a um acréscimo de 5%, alcançando 350 milhões de hectares, pouco mais de 40% do território brasileiro. Porém, deve-se relativizar esse percentual, visto que aproximadamente 21% da área total destes estabelecimentos estão reservados à preservação ambiental, conforme os percentuais regionais definidos no Código Florestal.
- A produção de grãos aumentou de 117 milhões de toneladas para 240 milhões de toneladas devido, basicamente, não à expansão da área, que foi de apenas 5%, mas pela incorporação de 408 mil tratores em 200 mil estabelecimentos (aumento de 50%, elevando a frota do país a 1,2 milhão unidades), à adoção de colheitadeiras, máquinas e equipamentos, à ampliação de 52% na área irrigada, aos silos modernos, e a novo modelo de gestão.
- O rebanho da pecuária bovina diminuiu em 5 milhões de cabeças no período e houve diminuição da área ocupada em 11 milhões de hectares, a qual veio a ser ocupada por lavouras. Já a área de pastagem cultivada para pecuária bovina cresceu 9 milhões de has. Ou seja, a pastagem cultivada aumentou e a pastagem degradada diminuiu.
A produção de carne bovina que era de 9 milhões de toneladas em 2016, subiu para 9,4 milhões de toneladas em 2017. Isso foi possível porque, além da melhoria nas pastagens, o setor adotou tecnologias modernas na genética, nutrição e sanidade. Essa grande inovação também aconteceu na avicultura e suinocultura.
- O número de trabalhadores no campo diminuiu em 1,5 milhão de pessoas, em um movimento similar ao dos demais setores da economia, em função da substituição da mão de obra por máquinas e equipamentos intensivos de capital e não de trabalho. O lado positivo é que isso diminuiu o desgaste dos trabalhos no campo e aumentou a produtividade.
Cabe acrescentar que o verdadeiro êxodo rural, registrado na década de 1985 a 1996, que envolveu 5,5 milhões de pessoas, diminuiu de intensidade. Embora ainda alto, o fluxo rural-urbano caiu para a faixa de 1,5 milhão de pessoas em cada uma das duas últimas décadas
- O número de Estabelecimentos Rurais com mais de um mil hectares aumentou, com o surgimento de 3.287 novas propriedades com este porte. Isso elevou sua participação no total da área cultivada de 45% para 47,5%;
- A pré-desertificação no semi-árido nordestino avançou – como já se prevê há décadas – e explica a diminuição da área cultivada em 9 milhões de hectares e a redução de 5% no número de estabelecimentos no Nordeste. A região que se estende da Bahia ao Rio Grande do Norte foi a única no país a registrar diminuição na área cultivada e número de estabelecimentos.
- A modernização dos meios de comunicação foi rápida e generalizada. Os Estabelecimentos com acesso à internet aumentaram em 2.000%. Eram 75 mil em 2006, e alcançaram 1,4 milhão de propriedades (não de usuários). A telefonia rural também apresentou números grandiosos, com a instalação de 1,9 milhão de telefones nos últimos 11 anos.
- Houve envelhecimento da população do meio rural. Entretanto, há que se relativizar essa afirmação tendo em vista que o fenômeno ocorre em toda a população brasileira.
A participação das pessoas na faixa etária de 25 a 45 anos teve diminuição percentual no total, como consequência da opção de busca por melhores condições de vida nas cidades. Por seu turno, a participação do contingente de pessoas da faixa etária de 65 anos ou mais, que era de 17,5%, subiu para 21,4%.
- A participação da mulher no comando dos estabelecimento rurais aumentou, coerentemente com a tendência nos domicílios e nas empresas do país. As mulheres dirigiam 18,6% dos estabelecimentos rurais, em 2017, contra 12,7% em 2006. E mais, quando se considera a co-direção, essa participação sobe para 1,7 milhão de Estabelecimentos, ou seja, 34% do total.
Por outro lado, não é verdadeiro afirmar que:
- O aumento de 20% no número de estabelecimentos rurais que utilizaram defensivos agrícolas no período signifique que houve um forte aumento na sua utilização. Não se pode desconsiderar que houve um aumento de 100% no volume produzido e que a nova agricultura brasileira realiza duas a três plantios na mesma área. Portanto, só a relação entre volume de defensivos utilizados por área ou por volume produzido é que permitiria afirmar que grau de incremento houve.
E os referidos dados não foram perguntados no Censo. Apressadamente, determinados críticos da agricultura já adiantaram tais conclusões, mesmo sem o embasamento numérico oficial.
- A expansão da área ocupada pela agropecuária ocorreu via desmatamento da Amazônia? Segundo “o Instituto Nacional de Pesquisa Espaciais (INPE), 9,6 milhões de hectares foram desmatados na Amazônia Legal para dar lugar à agropecuária. E principalmente nos estados do Mato Grosso e Pará, que mais desmataram na Amazônia Legal (Estadão, 27/07/18, pág. B-5, Economia). Na mesma matéria, uma dirigente do Imazon afirma que a destruição da floresta é mais perceptível na região onde aumentou o número de frigoríficos.
Ora, primeiro não é intelectualmente honesto confundir Amazônia Legal, definida na década de 1970 para efeito de incentivos fiscais, que envolve área de cerrados (principalmente no Tocantins, Roraima, Mato Grosso e sul do Pará) com a floresta tropical úmida amazônica.
Segundo a expansão da agricultura na região Norte está ocorrendo em áreas de pastagens degradadas ou em áreas permitidas pelo Código Florestal, portanto, sob forma legal e limites controlados.
O próprio Coordenador do Censo, Antônio Carlos Florido na matéria citada “afirma que os dados não permitem concluir que a agropecuária está avançando sobre florestas virgens”.
Conclusões importantes a partir dos dados do Censo:
- Em apenas 11 anos, uma parcela substancial dos agricultores passou a dispor de muito mais informações sobre sua atividade, o país e o mundo em tempo real.
- As mulheres têm importância maior e crescente na gestão dos estabelecimentos rurais, o que muda o modelo de gestão.
- Uma parcela dos jovens está saindo da atividade rural e os mais velhos continuam na direção dos estabelecimentos.
- As três esferas de governo e outras entidades que atuam no setor continuam lentas na adaptação aos novos tempos, o que no caso implica em lidar com um público que passou a ter acesso a informações, a tecnologias, gestão e condições de mercado, em tempo real, além de uma estrutura produtiva do campo que se modernizou rapidamente em todos os sentidos, acompanhando movimento similar em outros setores da economia e da sociedade.
Fonte: Blog do Benedito Rosa - Senso Agropecuário
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