ENTREVISTA: ONU precisa liderar ascensão da diplomacia pela paz, diz Guterres
quinta-feira, setembro 14, 2017
Enquanto os países se preparam para o
debate geral e as reuniões de alto nível da Assembleia Geral da ONU, que
reúne ministros, chefes de Estado e de governo de praticamente todos os
Estados-membros, o secretário-geral das Nações Unidas, António
Guterres, conversou com a UN News sobre o papel da Organização em um
mundo que enfrenta cada vez mais desafios.
Guterres, que foi primeiro-ministro de Portugal de 1995 a 2002 e chefiou a Agência da ONU para Refugiados (ACNUR), assumiu o cargo em 1º de janeiro. Ele tem defendido, entre outras coisas, um maior papel da diplomacia em importantes questões globais; uma maior aderência aos objetivos do acordo de Paris; um engajamento mais amplo com a juventude mundial; e dedicados esforços para garantir a paridade de gênero no Sistema ONU.
Enquanto os países se preparam para o debate geral e as reuniões de
alto nível da Assembleia Geral da ONU, que reúne ministros, chefes de
Estado e de governo de praticamente todos os Estados-membros, o
secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, conversou com a UN News sobre o papel da Organização em um mundo que enfrenta cada vez mais desafios.Guterres, que foi primeiro-ministro de Portugal de 1995 a 2002 e chefiou a Agência da ONU para Refugiados (ACNUR), assumiu o cargo em 1º de janeiro. Ele tem defendido, entre outras coisas, um maior papel da diplomacia em importantes questões globais; uma maior aderência aos objetivos do acordo de Paris; um engajamento mais amplo com a juventude mundial; e dedicados esforços para garantir a paridade de gênero no Sistema ONU.
Guterres, que foi primeiro-ministro de Portugal de 1995 a 2002 e chefiou a Agência da ONU para Refugiados (ACNUR), assumiu o cargo em 1º de janeiro. Ele tem defendido, entre outras coisas, um maior papel da diplomacia em importantes questões globais; uma maior aderência aos objetivos do acordo de Paris; um engajamento mais amplo com a juventude mundial; e dedicados esforços para garantir a paridade de gênero no Sistema ONU.
Afirmando que a ONU “precisa ser um instrumento para um crescimento da diplomacia para a paz”, o secretário-geral detalhou como está trabalhando com a comunidade internacional para que as partes nos conflitos vejam que “ninguém está ganhando” com as devastadoras guerras atuais; para que a conexão entre mudança climática e desenvolvimento sustentável garanta um mundo globalizado que “não deixe ninguém para trás”; e para seguir sua profunda crença de que a presença equitativa de homens e mulheres faz com que as organizações trabalhem melhor.
Leia abaixo a entrevista.
UN News: Às vésperas da nova sessão da Assembleia Geral e de seu debate geral, qual o papel do multilateralismo no mundo hoje e como você irá atuar para fortalecer esse papel?
Secretário-geral: Vivemos em um mundo com problemas globais — mudança climática, terrorismo, desigualdade — e não há forma de solucioná-los de país em país. Vemos, cada vez mais, que apenas soluções globais podem enfrentar problemas globais. E para que soluções globais sejam possíveis, precisamos ter mecanismos de governança permitindo que os países se unam e administrem juntos os problemas dos nossos tempos.
Portanto, as organizações multilaterais — como a ONU, mas também muitas outras, como o Fundo Monetário Internacional (FMI), o Banco Mundial, organizações regionais como a União Europeia, a União Africana — são essenciais para nos permitir enfrentar os desafios dramáticos que ameaçam a humanidade hoje.
UN News: Com todos os desafios que o mundo enfrenta atualmente — terrorismo, extremismo, crise de refugiados — qual a sua visão sobre o papel da ONU hoje?
Secretário-geral: A ONU precisa, primeiramente, ser um instrumento para um crescimento da diplomacia para a paz, e estamos fazendo tudo o que podemos, enfrentando todas as crises que temos — de Mali, Sudão do Sul, Líbia e República Centro-Africana à Síria, Afeganistão e Somália — para convencer as partes nesses conflitos e aqueles que têm influência, que apoiam as partes no conflito, de que ninguém está ganhando, todo mundo está perdendo.
É absolutamente essencial que esqueçam suas diferenças, seus interesses contraditórios, e que se unam para colocar um fim a essa série de crises trágicas, de violências e conflitos. Porque esses conflitos também estão se tornando cada vez mais interligados e mais ligados ao terrorismo global.
Então, precisamos combater os terroristas onde eles estiverem, mas precisamos enfrentar as causas do terrorismo. Isso significa resolver conflitos e, ao mesmo tempo, construir sociedades coesas onde as pessoas possam se sentir pertencentes, onde não se sintam discriminadas e que respeitem os direitos humanos, para garantir que organizações terroristas tenham cada vez mais dificuldades em recrutar pessoas.
O desemprego da juventude, por exemplo. O desemprego jovem em certas partes do mundo é um dos problemas mais dramáticos e que facilitam o trabalho de organizações terroristas que recrutam pessoas que não têm futuro. Então, precisamos — no desenvolvimento sustentável, nos direitos humanos e nas abordagens de paz e segurança — combinar todos os instrumentos de forma a sermos capaz de derrotar o terrorismo.
UN News: Vemos os efeitos das mudanças climáticas no mundo todo. Qual a sua mensagem para todos os envolvidos — governos, sociedade civil, cidadãos — sobre esse fenômeno e sobre os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS)?
Secretário-geral: Em primeiro lugar, a mudança climática é hoje inegável. Acabei de voltar do meu país, Portugal, onde estamos tendo uma enorme seca no sul. Estamos vendo incêndios florestais se multiplicando terrivelmente. Nos Estados Unidos, como em Portugal e em outras partes do mundo, estamos vendo ondas de calor, inundações dramáticas — em Serra Leoa, Índia, Nepal —, sempre tivemos inundações no passado, mas agora os desastres naturais estão se tornando mais frequentes, mais intensos e com consequências mais devastadoras. Vemos os desertos aumentando, enquanto as geleiras diminuem. Vemos o nível dos oceanos aumentando. Então, isso é claramente uma ameaça a todos nós.
Em segundo lugar, para combater esses problemas temos hoje um importante instrumento, o Acordo de Paris. Precisamos garantir que todos os países se comprometam com esse acordo. E mesmo que alguns países não consigam fazê-lo no nível governamental, que as sociedades, as empresas, as cidades sejam capazes de liderar o processo. Podemos ser capazes de atender o Acordo de Paris, mas com uma ambição cada vez maior porque o acordo não é suficiente para conter o aquecimento global de uma maneira aceitável.
Ao mesmo tempo, precisamos ver que há uma clara conexão entre as mudanças climáticas e o desenvolvimento, e a sustentabilidade do desenvolvimento. Portanto, a Agenda 2030 e os ODS são o programa global aceito por todos os Estados-membros para uma globalização justa. Uma globalização que não deixe ninguém para trás. Ao contrário do que aconteceu no passado recente, no qual vimos tantas regiões que estão dramaticamente, negativamente afetadas pelo progresso tecnológico ou pela globalização.
Precisamos garantir que a globalização, que trouxe enormes vantagens à humanidade, não deixe ninguém para trás. Para que haja inclusão e sustentabilidade, para que nossas crianças e netos também se beneficiem do que conquistamos hoje.
UN News: Quando assumiu o cargo, você prometeu fortalecer a paridade de gênero no Sistema ONU. Olhando para os últimos meses, está satisfeito com o progresso até agora? Quais são seus planos?
Secretário-geral: Nomeei membros do Conselho de Administração da ONU, que é um dos principais órgãos das Nações Unidas, e entre nomeações e renovações de mandatos temos 19 mulheres e 17 homens, o que significa que a paridade tem sido levada muito a sério por mim nas decisões. E teremos, no fim de meu mandato — esse é um compromisso muito forte — no nível de assistentes de secretários-gerais e sub-secretários-gerais no Conselho, em toda a Organização, paridade total.
Acabamos de aprovar um plano para a paridade de gênero que iremos submeter aos Estados-membros nas áreas onde os países precisam tomar decisões com vistas a atingir a paridade de gênero em 2023 na maior parte das áreas da ONU. Mas para aqueles que têm mais dificuldades, a meta é atingir em 2028 a total paridade para os funcionários internacionais no Conselho. Então, trata-se de um forte compromisso. Não é apenas porque essa ideia está agora no debate público. É porque acredito profundamente que as organizações funcionam muito melhor quando há presença equitativa de homens e mulheres.
UN News: Na sua juventude, você buscou defender os princípios nos quais acreditava. O que você diria para os jovens do mundo de hoje que querem fazer algo contra o racismo, a islamofobia, o antissemitismo e a discriminação?
Secretário-geral: Os jovens são minha esperança porque eles são muito mais cosmopolitas. Eles são muito menos propensos a essas abordagens irracionais de nacionalismo, xenofobia, racismo; eles entendem a diversidade como uma riqueza; não como uma ameaça. Espero que os jovens impulsionem suas sociedades, comunidades, governos, a entender que precisam ter políticas de coesão social, políticas que permitam o sentimento de que suas identidades são respeitadas, mas, ao mesmo tempo, que eles pertencem à comunidade como um todo.
UN News: As pessoas querem conhecê-lo no nível pessoal. Então, tenho algumas perguntas. Você é fã de História. Quais são suas figuras históricas favoritas?
Secretário-geral: Duas personalidades tiveram importante influência sobre minha vida política, tanto ideologicamente como em relação à atitude política, comportamento político. A primeira foi, na minha juventude, (o político sueco) Olof Palme. Outra influência foi, na maturidade da minha vida, Nelson Mandela. Acredito que eles sejam uma combinação fantástica: de um lado, as políticas que são claramente orientadas para a igualdade, para uma visão progressista de mundo, de igualdade entre as pessoas e entre as sociedades.
Olof Palme deu uma fantástica contribuição ao desenvolvimento de uma visão progressista de seu país e das relações internacionais. E Nelson Mandela é o símbolo do perdão, da tolerância e da capacidade de reconstruir uma sociedade que foi tão profunda e tragicamente dividida.
UN News: Quem é seu autor favorito e qual o seu livro preferido?
Secretário-geral: Sou, como você disse, um leitor compulsivo de história. Há dois autores de história que eu realmente considero os melhores que li. Um deles é francês, Georges Duby. Ele foi um excelente medievalista. O outro é britânico, A. J. P. Taylor. Mas, é claro, sou português; vim de um país de poetas. Há um poeta português que considero absolutamente único: Fernando Pessoa.
UN News: Com todas as suas responsabilidades como chefe de uma Organização procurada pelas pessoas para trazer soluções em um mundo complexo, o que você faz para reduzir o estresse? O que faz para se divertir?
Secretário-geral: Eu gosto muito de música. Então, escuto música em casa. Vou a concertos e operas frequentemente. Gosto muito de arte contemporânea, então, Nova Iorque é o melhor lugar do mundo — há as galerias do (bairro do) Chelsea e outras, exibições contemporâneas em diferentes museus.
Ao mesmo tempo, eu amo viajar, tentar descobrir aspectos da herança cultural e paisagens que sejam incomuns, ou ter contato com pessoas diferente e que podem nos enriquecer. Então, eu diria que essas são as áreas nas quais eu tento usar meu tempo livre para mim mesmo.
Fonte: Nações Unidas
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